Difícil imaginar onde o mais poderoso clube alemão estaria hoje sem Kurt Landauer. O bancário judeu que sobreviveu à Primeira Guerra e ao campo de concentração ajudou a moldar a vitoriosa história do time de Munique.
Homenagem feita a Kurt Landauer pela torcida do Bayern em seu estádio em Munique |
O banner e a impressionante coreografia da torcida acabaram dando origem à ideia de se produzir um filme sobre o dirigente. O canal ARD encampou o projeto e, em 2014, 130 anos depois do seu nascimento, o filme Landauer – o homem que inventou o Bayern Munique estreava na televisão.
Ainda adolescente, Landauer se apaixonou pelo futebol e pelo Bayern Munique. No começo do século passado, jogar futebol era considerado "coisa de pobre". Mas o jovem Kurt não estava nem aí e, aos 17 anos, vestiu pela primeira vez a camisa do seu clube.
Jogava no gol, mas logo percebeu que não levava muito jeito.
Passou então a exercer funções administrativas, já que possuía uma formação profissional como bancário. Em 1913, aos 29 anos, acabou se tornando presidente do Bayern, mas por pouco tempo.
Em 1914 estourava a Primeira Guerra Mundial, e ele foi para a frente de batalha, assim como outros tantos milhares de judeus alemães. Na sua volta, em 1919, foi eleito novamente presidente do clube.
Os 14 anos subsequentes iriam representar a primeira época de ouro do Bayern. Visionário, Landauer criou um departamento para descobrir e incentivar jovens talentos. Naqueles tempos, mais de 500 jovens treinavam e jogavam regularmente nas mais diversas categorias do clube.
Os frutos deste trabalho não demoraram a chegar. Em 1926 e 1928 o Bayern foi campeão do Sul da Alemanha e chegou à final do campeonato alemão em três oportunidades (1926, 1928 e 1929).
O auge foi em 1932, quando os bávaros conquistaram pela primeira vez na sua história o título de campeão alemão ao derrotar o Eintracht Frankfurt por 2 a 0. Kurt Landauer estava feliz porque viu seus esforços serem coroados de pleno êxito.
Sua felicidade, porém, iria durar pouco. Um ano depois, os nazistas, com Adolf Hitler à frente, assumiram o poder. Com a instauração da ditadura, veio a nazificação que impregnou todas as esferas da sociedade alemã, inclusive o esporte e, especificamente, os clubes de futebol.
Landauer foi obrigado a se demitir do cargo de presidente do Bayern. Em 1938 foi preso e levado para o campo de concentração de Dachau, onde ficou por dois meses. Após sua temporária liberação pelas autoridades nazistas, conseguiu fugir para a Suíça. Suas três irmãs foram assassinadas.
Voltou à Alemanha tão somente em 1947, onde novamente assumiu a presidência do Bayern, exercendo o cargo até 1951.
Naquela época, os aliados estavam empenhados em desnazificar as instituições alemãs, inclusive os clubes de futebol. Havia razões suficientes para tanto: o papel dos clubes de futebol durante a ditadura nazista foi nefasto. Todos os clubes passaram por auditorias para determinar o seu papel, a serviço ou não, do regime nazista. A própria Federação Alemã de Futebol foi um instrumento dócil e se deixou manipular pela máquina de propaganda ideológica montada por Hitler, Goebbels e asseclas.
Um dos primeiros clubes a voltar a funcionar normalmente foi justamente o Bayern Munique, que, além de ter tido um presidente judeu de 1919 a 1933, não se submeteu à "nazificação" dos seus quadros e resistiu o quanto pôde até 1943.
Na sua gestão de 1947 a 1951, a prioridade de Landauer na presidência foi colocar o clube esportiva e administrativamente nos eixos. Para tanto, apesar de forte oposição, conseguiu convencer os associados do clube a adquirir um terreno de 80 mil metros quadrados onde até hoje se ergue a sede do Bayern Munique, na Säbener Strasse nº 51. Era um visionário!
Um visionário e um cosmopolita que, durante as décadas subsequentes à sua morte, em 1961, foi passando para o esquecimento, relegado aos arquivos mortos da história. O próprio atual diretor executivo, Karl-Heinz Rummenigge, disse recentemente que em seus primeiros dez anos no Bayern, de 1974 a 1984, jamais tinha ouvido falar de Kurt Landauer.
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